Última alteração: 2023-08-14
Resumo
A pesquisa em questão parte de uma investigação de doutorado, que apresenta como objetivo analisar como o comportamento informacional dos portadores do vírus da imunodeficiência humana (HIV) interfere no tratamento do sistema imunológico e na prevenção do contágio a terceiros.
Comportamento Informacional é todo comportamento humano relacionado às fontes e canais de informação, incluindo a busca ativa e passiva de informação (WILSON, 2000). No espectro da saúde pública, compreendida como operações direcionadas à manutenção e ao tratamento adequado da saúde da população, o comportamento informacional compreende atividades de pesquisa de informações relacionadas à orientação e prevenção de enfermidades que acometem a sociedade, a partir do desenvolvimento de competências para a preservação da vida.
Contudo, a escassez de investigações que aprofundem em discussões complexas de temáticas como ‘saúde pública’, ‘informação em saúde’ e ‘comportamento informacional humano’ reivindica uma agenda de pesquisa pautada em ensejos epistemológicos da Ciência da Informação e Ciências da Saúde. O presente tema foi escolhido devido ao interesse da autoria por este fenômeno na atualidade, assim como após o pesquisador apresentar a primeira etapa da pesquisa de doutoramento no Colóquio Internacional da Medicina na Era da Informação (IV Medinfor), ocorrida na Faculdade de Letras da Universidade do Porto em 2017.
Compreender o comportamento do indivíduo quanto à necessidade, procura e apropriação (uso) da informação tem sido uma das preocupações recorrentes da Ciência da Informação (CI) desde seus primórdios, o que culminou na proposição de uma série de modelos e abordagens.
A inquietação da autoria em entender como o sujeito se comporta no processo de procura, compartilhamento e apropriação (uso) da informação remonta aos estudos desenvolvidos a partir do final da década de 1940, apesar de, à época, estar em foco o uso das fontes e sistemas e não os aspectos humanos do uso da informação, caracterizando-se mais como estudo de “uso” do que de “usuários” (Pinheiro, 1982; Wilson, 2000; Araújo, 2012).
As pesquisas que passaram a utilizar uma abordagem centrada no usuário começaram a ser desenvolvidas a partir da década de 1980, tendo como nomes de relevância, dentre outros, os de Nicholas Belkin (1980), Brenda Dervin (1986), Carol Kuhlthau (1991), David Ellis (1989) e Tom Wilson (2000).
A maioria dos modelos de comportamento informacional são definições, frequentemente na forma de diagramas, que procuram descrever uma atividade de procura de informação, as causas e consequências dessa atividade, ou ainda os relacionamentos entre os estágios ou fases no comportamento de busca de informação (WILSON 1999).
O modelo Anomalus State of Knowledge (ASK), proposto por Belkin (1980), parte da premissa de que uma necessidade de informação surge a partir de uma anomalia reconhecida no estado de conhecimento do usuário, referente a um tópico ou situação. É uma proposta útil para ampliar o entendimento do comportamento informacional, por abarcar as dimensões cognitiva e social dos usuários (ROLIM; CÉNDON, 2013).
O modelo Sense Making proposto por Brenda Dervin (1986) propõe avaliar como os usuários percebem, compreendem, interagem com as fontes informacionais e usam a informação e outros recursos neste processo, que tem como foco a “Construção de Sentidos” a partir das experiências sociais, culturais, políticas e econômicas do sujeito (FERREIRA, 2008).
O Modelo de Ellis (1989) não apresenta um diagrama, comum aos outros modelos, mas uma série de categorias de atividades relacionadas à busca informacional. O modelo é relevante por resultar de pesquisa empírica e de ter sido testado em diversos estudos (WILSON, 1999).
Kuhlthau (1991) em seu modelo Information Search Process (ISP) fez uma associação entre sentimentos, pensamentos e atitudes e mescla características da abordagem fenomenológica com a cognitiva. O foco do modelo é o processo de busca de informação que identifica os caminhos da construção do conhecimento. Para a autora “a busca de informação é um processo de construção que envolve a experiência de vida, os sentimentos, bem como os pensamentos e as atitudes de uma pessoa” (KUHLTHAU, 1991, p.362).
Wilson (2000) elaborou o modelo de comportamento informacional, em 1981, voltado para as necessidades de informação que podem ser analisadas pelo viés das suas necessidades fisiológicas, afetivas ou cognitivas, relacionando-se com o indivíduo como ser social, em todas as esferas da sua vida cotidiana e do ambiente, onde suas atividades são desenvolvidas.
Em 1996, Wilson revisita seu modelo com uma importante contribuição do modelo desenvolvido por Dervin (1983), o Sense Making, que inclui uma percepção entre a pessoa e sua consciência da necessidade de informação. (Martínez-Silveira; Oddone, 2007).
Para cumprir o objetivo anunciado na presente pesquisa, determinaram-se os procedimentos metodológicos pautados nas análises teóricas dos modelos de comportamento supracitados que, de acordo com a literatura especializada, correspondem a temáticas que demandam pesquisas em ambientes empíricos distintos. Assim, o método de procedimento monográfico (estudo de caso) e nível da pesquisa descritivo; propondo-se a elaboração do questionário eletrônico estruturado, direcionado aos membros de quatro comunidades na rede social whatsapp (rede social ilustrativa), e o roteiro de entrevista orientado aos administradores das comunidades estudadas. Os grupos de analisados compuseram um ambiente de apoio a pessoas soropositivas em diversas cidades brasileiras.
Os resultados logrados na segunda etapa da investigação autorizaram evidenciar que uma parte expressiva dos participantes obtém informações atinentes ao HIV por meio de múltiplas fontes, como médicos, profissionais de saúde, organizações especializadas, sites confiáveis e grupos de apoio online. No entanto, também foi observado que algumas fontes de informação não são confiáveis, o que pode levar a equívocos e decisões inadequadas.
Verificou-se também que os participantes demonstram um conhecimento geral satisfatório acerca do HIV, especialmente em relação às formas de transmissão e às medidas de prevenção. No entanto, ainda existem lacunas de conhecimento em relação a questões específicas, como os avanços no tratamento antirretroviral e as estratégias para aprimorar a adesão ao tratamento.
No aspecto à adesão ao tratamento, constatou-se que o comportamento informacional desempenha um papel fundamental na adesão ao tratamento. Os participantes que procuraram informações precisas e atualizadas relacionadas à terapia antirretroviral e seus benefícios tiveram uma maior probabilidade de aderir ao tratamento de forma consistente. Por outro lado, aqueles que tiveram acesso a informações incorretas ou desatualizadas enfrentaram dificuldades em aderir ao tratamento de forma adequada.
No espectro da prevenção do contágio observou-se que o comportamento informacional também interfere na capacidade dos participantes de prevenir o contágio do HIV a terceiros. Os informantes que se mantiveram informados adequadamente sobre as práticas de prevenção, como o uso de preservativos e da Profilaxia Pré-Exposição do HIV (PrEP), a adoção de estratégias de redução de danos e a realização regular de testes de HIV, demonstraram uma maior consciência e cuidado na prevenção do contágio.
As considerações finais parciais permitiram evidenciar que o acesso a informações precisas, atualizadas e confiáveis desempenha um papel essencial no tratamento e prevenção ao contágio a terceiros. Os resultados parciais também demonstraram que a obtenção de informações por meio de fontes confiáveis, como médicos, profissionais de saúde e organizações especializadas, contribuiu para uma adesão ao tratamento antirretroviral.
ARAúJO, E. P. O.; PAULA, C. P. A.; ARAúJO, E. P. O.; PAULA, C. P. A. Comportamento informacional: introdução de perspectivas simbólicas e afetivas em investigações sobre usuários de informação. Prisma.com (Portugual), n. 34, p. 46-63, 2017.
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